Privatização da SABESP: Novos desafios e paradigmas na gestão contratual

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Em dezembro de 2023, o projeto que autorizou a privatização da SABESP foi aprovado pela Assembleia Legislativa de São Paulo.

Em julho de 2024, o grupo Equatorial Energia se tornou investidor de referência da SABESP, adquirindo 15% das ações da empresa.

Com a privatização da SABESP, foi planejado o aporte de R$ 69 bilhões até 2029, visando à universalização dos serviços de água e esgoto no estado de São Paulo. Do montante anunciado, R$ 15 bilhões têm previsão de serem aplicados já em 2025. Destes, R$ 8,5 bilhões são destinados ao Programa Integra Tietê, enquanto outros R$ 6,5 bilhões são designados às demais áreas da concessão. Esses investimentos beneficiarão mais de 8 milhões de pessoas em mais de 70 municípios do estado.

Principais riscos identificados

A alta dos investimentos em saneamento no estado de São Paulo resultou em uma disparada no número de obras, tanto no Programa Integra Tietê (abrangido principalmente pela Grande São Paulo), quanto no interior do estado. Todavia, essa concentração de obras traz consigo alguns riscos, visto que, historicamente, os valores investidos na área de saneamento até então foram muito menores que os previstos entre 2025 e 2029.

O alto volume de investimentos concentrados no ano de 2025 poderá levar a problemas de escassez de mão de obra especializada e, principalmente, em equipamentos no setor, com o consequente aumento do preço causado pela alta demanda. Projetos de saneamento são dependentes de equipamentos e materiais específicos (e.g. mini shield), cuja disponibilidade no mercado é limitada.

A matriz de riscos dos contratos de saneamento passou a ser mais desafiadora para o empreiteiro sob a nova administração da SABESP. Esses riscos devem ser cuidadosamente mapeados e monitorados. A depender da sua criticidade e nível de priorização, deverão ser tomadas decisões estratégicas para o seu tratamento e mitigação.

Nesse sentido, citam-se riscos típicos identificados nesses contratos, como aqueles relacionados a questões de subsolo (diferentes condições de site ou interferências não cadastradas), condições climáticas, questões fundiárias (desapropriações), liberação de área (principalmente em áreas adensadas, onde é necessário que se faça desvios de tráfego), revisões de projeto, interface com a fiscalização.

Novos paradigmas da gestão contratual

O contratante privado tende a exercer uma administração contratual mais ativa, gerando registros diários sobre eventos atribuíveis ao empreiteiro.

Em caso de desvios de prazo não justificados, o empreiteiro estará exposto à aplicação de penalidades contratuais, caso não tenha se posicionado adequadamente.

Nesse contexto, uma administração contratual proativa que elabore registros tempestivos e aderentes à realidade, além de antecipar os desvios do contrato, é fundamental para que o contratado se proteja, justificando (e compensando) eventuais atrasos, e consequentemente, eventuais multas. Nesse sentido, o monitoramento dos KPIs em uma base semanal, principalmente aqueles ligados a custo e prazo, é atividade que deve ser feita por profissionais experientes, que, a partir da leitura de dados retrospectivos, possam enxergar o contrato de forma prospectiva.

Além disso, também é importante que as empresas de saneamento se atentem à elaboração dos registros contemporaneamente à ocorrência dos eventos. De regra, se uma parte tem interesse em reclamar da outra um efeito de algum evento, ela deveria ter registrado esses eventos quando de sua ocorrência. No mesmo sentido, o prazo para notificação de inadimplementos deve observar o disposto no contrato ou nas práticas de gestão.

Por certo, a nova administração SABESP trará novos paradigmas na forma de conduzir a avaliação desses pedidos. Não se sabe, todavia, como será o comportamento da nova gestão.

A onda de investimentos que se espera será desafiadora para as empresas do setor, bem como para a nova administração SABESP, que enfrentará desafios com o número elevado de obras ocorrendo paralelamente. Seguramente, haverá uma mescla do corpo técnico da SABESP com novas equipes, e essa transição poderá tornar a gestão das obras ainda mais complexa, em razão da própria adaptação e integração de equipe e do fluxo de informações.

Outra mudança significativa nos contratos da SABESP é que não há mais a previsão de resolução de disputas em arbitragens, o que transfere maior insegurança àquele que recorrer ao litígio para reaver seus direitos, especialmente em razão dos prazos para trânsito em julgado de eventuais ações. Isso aumenta a necessidade de eventuais pleitos serem solucionados durante a execução da obra, e antes do fim dos contratos.

Uma administração contratual que permita aos contratos terem o desenvolvimento planejado, possibilitando correção de desvios, internos ou externos, de forma breve, é fator vital para saúde das empresas que farão parte deste ciclo de investimentos.

 

Autores: Geovane Martins, Guilherme Bahia e Paulo Lage